terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

O problema da insegurança

Krishnamurti
Do livro: O Egoísmo e o Problema da Paz – ICK - 1945

A existência é dolorosa e complexa. Para compreendermos os pesares que nos invadem a existência, devemos pensar-sentir por maneira nova, devemos enfrentar a vida de maneira simples e direta; se possível, devemos começar cada dia renovados. Devemos ser capazes, em cada dia, de fazer nova avaliação dos ideais e dos padrões que criamos. A vida só pode ser compreendida profunda e justamente, tal como existe em cada um de nós; vós sois essa vida e sem a compreenderdes não pode haver tranqüilidade e alegria permanentes.

Nosso conflito interior e exterior surge por obra de valores cambiantes e contraditórios, baseados no prazer e na dor, não é verdade? A causa de nossa luta é procurarmos descobrir um valor que seja inteiramente satisfatório, invariável e não perturbador; procuramos um valor permanente que proporcione perene deleite, sem vestígio de dúvida ou de dor. Nossa luta constante baseia-se nesta exigência de segurança permanente; queremos segurança, nas coisas, nas relações, no pensamento.

Sem compreender-se o problema da insegurança, não é possível a segurança. Se buscamos segurança, não a encontraremos; a busca da segurança acarreta a destruição da própria segurança. É necessária a insegurança para a com preensão da Realidade, porém uma insegurança que não seja o oposto da segurança. Uma mente bem ancorada, uma mente que se sente segura em algum refúgio, jamais pode compreender a realidade. O desejo de segurança gera a indolência; torna a mente-coração inflexível e insensível, timorata e sem penetração; impede o estar acessível à realidade. Na profunda insegurança é-nos dada a percepção da Verdade.

Mas necessitamos de uma certa segurança, para vivermos: necessitamos de alimento, de vestuário e de morada, sem o que não é possível a existência. Seria relativamente simples organizar e distribuir eficientemente os recursos necessários à vida, se ficássemos satisfeitos só com o provimento de nossas necessidades fundamentais de cada dia. Não haveria egoísmo nem nacionalismo; não haveria expansão com petitória nem crueldade; não haveria necessidade de governos soberanos separados não haveria guerras se ficássemos inteiramente satisfeitos com o provimento de nossas necessidades diárias. Entretanto, assim não o é.

Mas, porque não é possível organizar os meios de atender às nossas necessidades? Não é possível, em virtude do conflito incessante de nossa vida cotidiana, com sua avidez, sua crueldade e seus rancores. Não é possível, porque nos valemos de nossas necessidades como meios para satisfação de nossas exigências psicológicas. Porque, interiormente somos estéreis, vãos, destrutivos, servimo-nos de nossas necessidades como meio de fuga. E assumem elas, por isso, importância muito maior do que realmente têm. Tornam-se, psicologicamente, de suma importância. Ganham, assim, enorme significado os valores mundanos. A propriedade, o nome, o talento, tornam-se meios para se galgarem posições, para se alcançar o poder e a dominação. Relativamente às coisas feitas pela mão ou pela mente, vivemos em perene conflito; por esse motivo, a elaboração de planos econômicos para a existência converte-se no problema predominante. Desejamos coisas que criem a ilusão de segurança e conforto, mas que só nos trazem conflito, confusão e antagonismos. Perdemos, na segurança das coisas produzidas pelo intelecto, aquela felicidade da Realidade criadora, cuja natureza intrínseca é a insegurança. A mente que busca a segurança vive em perene temor; nunca tem alegria, nunca experimenta o estado de potência criadora. A forma suprema do pensar-sentir é a compreensão negativa, e a sua verdadeira base, a insegurança.

Quanto mais estudamos o mundo sem compreendermos os nossos anseios, exigências e conflitos psicológicos, tanto mais complexo e insolúvel se torna o problema da existência. Quanto mais planejamos e organizamos a nossa existência econômica, sem compreender e transcender as nossas interiores paixões, temores, despeitos, tanto mais conflito e confusão haverão de surgir. O contentar-se com pouco resulta da compreensão de nossos problemas psicológicos, não da legislação ou do esforço determinado de ter poucas posses. Devemos eliminar, inteligentemente aquelas exigências psicológicas que encontram satisfação nas coisas, nas posições, na eficiência. Quando não procurarmos o poder e o domínio, quando deixarmos de ser egoístas, haverá a paz. Mas, enquanto nos servirmos das coisas, das relações, ou das idéias, como meios de satisfazer nossas sempre crescentes exigências psicológicas, haverá contendas e misérias. Com a isenção do anseio vem o correto pensar, e só este pode trazer a tranqüilidade.

Krishnamurti – Do livro: O Egoísmo e o Problema da Paz – ICK - 1945

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