PERGUNTA: A tradição, os ideais e um certo senso de moralidade social mantinham as pessoas medíocres como eu ocupadas de maneira virtuosa; mas essas coisas já perderam para a maioria de nós toda a significação. Como podemos libertar-nos de nossa mediocridade?
KRISHNAMURTI: Senhores, que é uma mente medíocre? Não a definais - uma definição pode achar-se facilmente num dicionário -, mas observai vossa mente e tratai de descobrir por que é ela vulgar, medíocre. Diz o interrogante que a tradição, os ideais e um certo senso de moralidade social mantinham ocupadas, de maneira virtuosa, as pessoas medíocres como ele. Ora, isso não era uma "maneira virtuosa", mas uma maneira tradicional. Fazer o que a sociedade manda não é virtude; é meramente atuar como gramofone, e isso nada tem em comum com a virtude. Virtude implica liberação da avidez, da inveja, da ambição de poder, e que a pessoa fique só. Somente então pode-se falar em virtude. Atuar mecanicamente, porque durante séculos fostes educados para pensar de uma certa maneira e ajustar-vos a um certo padrão, isso não é virtude.
Que é então mediocridade? Não o sabeis? Não sabeis o que é uma mente medíocre? Ora, isso é muito simples. A mente ocupada é uma mente medíocre. Com o que quer que esteja ocupada - Deus, bebidas, sexo, poder - ela é uma mente medíocre. Compreendeis, senhores? A mente que pratica virtude de manhã à noite é uma mente ocupada, e portanto, medíocre já que está interessada em si própria. Podeis dizer: "Não estou interessado em mim mesmo; estou interessado na Índia"; mas isso é apenas transferir a própria identidade pra a uma coisa e ficar ocupado com essa coisa. Toda ocupação - com um livro, um pensamento, com qualquer uma dúzia de coisas - denota mediocridade, porque a mente ocupada não é uma mente livre. Só a mente livre pode dar atenção a uma coisa e depois "soltá-la" - e isso é bem diferente de ficar ocupado com ela. A mente ocupada jamais pode ser livre. Examinai vossa mente, para verdes quanto ela está ocupada com vossos interesses, com vossa família, vosso emprego; da manhã à noite, nunca há um momento em que esteja vazia - o que não significa um estado de apatia, de vegetação, ou de devaneio. Isso não é vazio. Quando a mente está ocupada, cansa-se e opõe-se a pensar vagamente noutra coisa - e isso é apenas outra forma de ocupação. Não é disso que estou falando. A mente não ocupada acha-se em extremo vigilante, mas não em relação a alguma coisa. Seu estado é de atenção completa; e no momento em que existe esse estado, há criação. Essa mente deixa de ser medíocre; quer viva na aldeia, quer na capital, já não está dominada pelos ditames da sociedade. Mas isso requer laboriosa investigação de si mesmo, e não complacência dos pequenos êxitos; é resultado de um trabalho realmente penoso para descobrir o motivo da ocupação mental.
Não estais vendo, senhores, que andais ocupados com os assuntos de outras pessoas porque vós sois as outras pessoas, não sois vós mesmos. Não vos conheceis. Estais ocupados com coisas que vos disseram serem importantes, mas, se tiverdes um sentimento real a respeito de uma dada coisa, vereis que já não haverá ocupação. O homem dotado de profunda sensibilidade não é uma pessoa medíocre; porém, quando procura expressar essa sensibilidade em palavras e faz muito "barulho" em torno dela, quando com essas palavras busca a fama, a notoriedade, dinheiro ou o que quer que seja, então ele se torna medíocre. Assim, a investigação da mediocridade é uma investigação de vossa própria mente, e com ela descobrireis que a mente ocupada permanece sempre medíocre.
Krishnamurti - Madrasta - 23 de dezembro de 1956
Do livro: O homem livre - Ed. Cultrix