terça-feira, 31 de julho de 2012

Pensamento e Consciência

Todas as coisas estavam se recolhendo em si mesmas. As árvores se fechavam em seu próprio ser; os pássaros dobravam suas asas para meditar sobre as divagações do dia; o rio perdera seu fulgor e as águas não mais dançavam, estavam calmas e reservadas. As montanhas estavam distantes e inacessíveis e o homem se recolhera em sua casa. A noite chegara e havia a tranqüilidade do isolamento. Não existia comunhão; cada coisa havia se fechado, isolado. A flor, o som, a conversa – tudo estava abrigado, invulnerável. Havia risos, mas eram isolados e distantes; a conversa era abafada e vinha do interior. Somente as estrelas estavam convidativas, abertas e comunicativas; mas elas estavam muito distantes.

O pensamento é sempre uma reação externa, ele jamais pode reagir profundamente. O pensamento é sempre o externo; o pensamento é sempre um efeito, e pensar é a conciliação dos efeitos. O pensamento é sempre superficial, embora possa se localizar em diferentes níveis. O pensamento jamais pode penetrar o profundo, o implícito. O pensamento não pode ir além de si mesmo, e cada tentativa de fazer isso produz sua própria frustração.

“O que você quer dizer com pensamento?”
O pensamento é a resposta a qualquer desafio; o pensamento não é ação, execução. O pensamento é uma conseqüência, o resultado de um resultado; é o resultado da memória. Memória é pensamento e pensamento é a verbalização da memória. A memória é experiência. O processo do pensamento é o processo consciente, o oculto assim como o aberto. Todo esse processo de pensamento é a consciência; o desperto e o adormecido, os níveis mais superficiais e os mais profundos são, todos, parte da memória, da experiência. O pensamento não é independente. Não existe pensamento independente; “pensamento independente” é uma contradição em termos. O pensamento, sendo um resultado, opõe-se ou concorda, compara ou se ajusta, censura ou justifica, e portanto ele nunca pode ser livre. Um resultado jamais pode ser livre, ele pode deturpar, manipular, divagar, ir até certa distância, mas não pode se libertar de seu próprio ancoradouro. O pensamento está ancorado na memória e jamais pode ser livre para descobrir a verdade de qualquer problema.

“Você quer dizer que o pensamento não tem valor algum?”
Ele tem valor na conciliação dos efeitos, mas não tem valor em si mesmo como um meio para a ação. Ação é revolução, não conciliação de efeitos. A ação livre de pensamentos, idéias e crenças jamais está dentro de um padrão. Pode haver atividade dentro do padrão e essa atividade pode ser violenta, sangrenta ou o oposto; mas não é ação. O oposto não é ação, é uma continuação modificada da atividade. O oposto ainda está dentro do campo do resultado, e na busca do oposto o pensamento é apanhado na rede de suas próprias reações. A ação não é o resultado do pensamento, ela não tem relação com o pensamento. O pensamento, o resultado, jamais pode criar o novo; o novo é de momento a momento, e o pensamento é sempre o antigo, o passado, o condicionado. Ele tem valor mas não liberdade. Todo valor é limitação, ele tolhe. O pensamento é restringente, pois é valorizado.

“Qual é a relação entre consciência e pensamento?”
Eles não são iguais? Existe alguma diferença entre pensar e estar consciente? O pensamento é uma resposta; e estar consciente não é também uma resposta? Quando a pessoa está consciente daquela cadeira, é uma resposta a um estímulo; e a reação da memória a um desafio não é pensamento? É essa reação que chamamos de experiência. Experienciar é desafio e resposta; e esse experienciar, junto com a nomeação ou registro disso, esse processo total, em níveis diferentes, é consciência, não é? A experiência é o resultado, a conseqüência da experienciação. O resultado recebe um termo; o próprio termo é conclusão, uma das muitas conclusões que constituem a memória. Esse processo de conclusão é consciência. A conclusão, o resultado, é a consciência de si mesmo. O Eu é memória, as muitas conclusões; e o pensamento é a reação da memória. O pensamento é sempre uma conclusão; pensar é concluir, e, portanto, nunca pode ser livre.

O pensamento é sempre o superficial, a conclusão. A consciência é o registro do superficial. O superficial se separa como o externo e o interno, mas essa separação não torna o pensamento menos superficial.

“Mas não existe algo além do pensamento, além do tempo, algo que não seja criado pela mente?”
Ou lhe contaram sobre esse estado, você leu sobre ele ou existe a experienciação dele. A experienciação dele nunca pode ser uma experiência, um resultado; ele não pode ser conjeturado – e se for, será uma lembrança, não uma experienciação. Você pode repetir o que leu ou ouviu, mas a palavra não é a coisa; e a palavra, a própria repetição, impede o estado de experienciação. Aquele estado de experienciação não poderá existir enquanto houver pensamento; o pensamento, o resultado e o efeito jamais podem conhecer o estado de experienciação.

“Então, como o pensamento pode acabar?”
Perceba a verdade que o pensamento, o resultado do conhecido, jamais pode existir no estado de experienciação. A experienciação é sempre o novo; pensar pertence sempre ao velho. Veja a verdade disso e ela lhe trará a libertação – libertação do pensamento. Do resultado. Então haverá aquilo que está além da consciência, que não é dormir nem acordar, que é sem nome: aquilo é.

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