Caminhamos subindo pela margem do rio e pegamos uma trilha que ladeava os verdes campos de trigo. Essa trilha era um caminho muito antigo; milhares de pessoas o haviam seguido e ele era rico em tradição e silêncio. Ele serpenteava entre campos e mangueiras, tamarindeiros e santuários abandonados. Havia grandes jardins e ervilhas-de-cheiro perfumando deliciosamente o ar. Os pássaros acomodavam-se para a noite e um grande lago começava a refletir estrelas. A natureza não estava comunicativa naquela noite. As árvores estavam arredias; recolheram-se a seu silêncio e escuridão. Alguns aldeões passaram conversando, em suas bicicletas, e mais uma vez houve profundo silêncio e aquela paz que chega quando todas as coisas estão sós.
Esse estar só não é a solidão dolorida e assustadora. É o estar só do ser; é incorrupto, rico, completo. Esse tamarindeiro não tem outra existência além de ser ele mesmo. Assim é esse estar só. Estamos sós, como o fogo, como a flor, mas não estamos atentos à pureza e à imensidão desse estado. Só podemos nos comunicar verdadeiramente quando existe esse estar só. Esta só é a purificação de todas as motivações, de todas as buscas do desejo, de todos os fins. O estar só não é um produto da mente. Você não pode desejar estar só. Tal desejo é simplesmente uma fuga da dor por alguém não ser capaz de se relacionar.
A solidão, com seu medo e dor, é isolamento, a ação inevitável do Eu. Esse processo de isolamento, seja ele expansivo ou estreito, produz confusão, conflito e sofrimento. O isolamento nunca pode dar origem ao estar só; um precisa cessar para que o outro seja. O estar só é indivisível, e a solidão é separação. Aquele que está só é flexível e, portanto, resistente. Apenas ele pode relacionar-se intimamente com aquele que é sem causa, o incomensurável. Para quem está só, a vida é eterna; para ele não há morte - nunca pode cessar o ser.
A lua estava começando a surgir por cima das copas das árvores e as sombras eram espessas e escuras.
Alguém começou a cantar na outra margem do largo rio e suas palavras eram claras e penetrantes. Mais uma vez o totalmente penetrante estar só da vida.
Krishnamurti - Comentários sobre o viver