O cérebro é um instrumento de surpreendente sensibilidade. Incansável em sua atividade de captar, registrar, interpretar e acumular impressões, ele não para jamais de funcionar. Herdando do animal o instinto de sobrevivência e a busca de segurança física, o cérebro tomou-os como base de todas as suas atividades e projeções, tais como deus, a virtude, a moral, a ambição, os desejos, as exigências e os ajustamentos. Por ser extremamente sensível, o cérebro, com sua capacidade de pensar, passa a dedicar-se ao cultivo do tempo, do passado, do presente e do futuro. Com isto, ele tem a oportunidade de adiar a ação, de buscar a satisfação, de perpetuar-se através da busca do ideal e do preenchimento. Daí nasce a dor, a fuga na crença, no dogma, no misticismo, em toda atividade e nas múltiplas formas de entretenimento.
A morte e o medo estão sempre presentes, obrigando o pensamento a buscar alívio e refúgio nas crenças, na esperança e nos conceitos, racionais ou irracionais. A verbalização e as teorias adquirem grande importância, servindo de base ao cotidiano e suscitando sentimentos e pensamentos condicionados. Por mais que se julgue profundo, o pensamento atua num âmbito bem estreito da vida. Seja ele hábil, seja experiente ou erudito, o pensamento é superficial. Como parte do todo, o cérebro, com sua incessante atividade, valorizou-se demais perante si mesmo e dos restantes fragmentos. Por serem a desintegração e a contradição suas características essenciais, é ele incapaz de perceber o todo. Acostumado a reagir e a pensar em termos de opostos, o cérebro vive até hoje no conflito, na confusão e no sofrimento.
O pensamento não pode compreender a vida integral. Essa compreensão nasce da absoluta imobilidade do cérebro e do pensamento, sem estar ele adormecido, embotado, pela disciplina e compulsão, ou hipnotizado. Extraordinariamente sensível, o cérebro pode permanecer imóvel e quieto sem que isto implique perda de sensibilidade ou capacidade de penetração. Surge o insondável mistério do incognoscível quando o tempo e a medida cessarem de existir.
Krishnamurti