Krishnamurti: "Como"? é uma pergunta de colegial. Mas vamos averiguar se é possível unir os dois processos que separam as coisas, quando em curso. Em primeiro lugar, sabemos que o pensador e o pensamento são separados. Estamos conscientes disso? Para você o pensador e o pensamento são duas entidades separadas e você deseja saber se é possível uni-las. Se o pensante está separado e está sempre dominando o pensamento, o pensamento está sempre tolhido e o pensante sempre a subjugá-lo. Não haverá trégua, haverá uma batalha constante entre o pensador e o pensamento. Preciso averiguar se é possível os dois existirem juntos, de modo que não haja divisão, nem batalha; porque reconheço que só quando não há luta existe algo novo.
A violência não produz a paz; só quando não há violência, há paz. Identicamente, preciso verificar se o pensador e o pensamento são duas entidades separadas, eternamente divididas, nunca unidas.
Você e eu vamos empreender juntos a viagem para descobrir e "experimentar" verdadeiramente o fato. Sabemos que o pensante e o pensamento estão separados. A maioria de nós nunca sequer refletiu a respeito, — o temos como um fato verdadeiro. Só quando alguém lhe faz essa pergunta, você começa a indagar; eu o interpelo, agora, e portanto você está indagando, está fazendo a viagem de investigação. Essa viagem é a compreensão do que é, do que está realmente acontecendo, e não do que você desejaria que acontecesse.
Porque estão separados o pensante e o pensamento? Não pergunto se deviam ou não estar separados, e, sim, porque estão separados. Estão separados por força do hábito. Nunca duvidamos disso; nós o aceitamos e o reconhecemos como coisa certa e verdadeira; por conseguinte, transformou-se em hábito. O pensante está separado do seu pensamento e a luta entre os dois, a dominação do pensamento pelo pensante, é um hábito diário, nosso — sendo o hábito, rotina, repetição. Isso é um fato, você não acha?
O que aconteceria se o pensante e o pensamento não estivessem separados? Minha mente se acostumou com esse hábito. O que lhe aconteceria se esse hábito cessasse? Sentir-se-ia perdida, não é assim? Ver-se-ia desnorteada, perplexa, diante de uma coisa inesperada, nova; por isso, a mente prefere viver de hábitos; e, assim, diz ela: "conservarei o meu hábito. Já que não sei o que acontecerá se aquelas duas entidades se juntarem, é melhor deixar as cosias como estão". Você está, pois, mais interessado na continuação do hábito do que em procurar saber o que aconteceria se o pensante e o pensamento se juntassem.
Por que desejamos que continue o velho hábito? Pela razão muito clara de que desejamos segurança, certeza, alguma coisa em que nos apoiarmos; porque é a única que conhecemos. Estamos bem seguros com relação ao pensador e o pensamento. Nunca pensamos no que aconteceria se eles se juntassem. A certeza faz com que nos apeguemos ao que é velho. Isso é um fato psicológico, um fato observável. Nosso problema, pois, não é de como unir o pensante e o pensamento, mas sim, de por que a mente busca segurança, certeza. Pode a mente existir sem certeza, sem estar procurando alguma coisa em que se apoiar — saber, crença, ou o que quer que seja? A mente não pode se abstrair do processo de segurança. A mente que conhecemos está segura; não lhe interessa indagar; só lhe interessa estar bem abrigada, em perfeita segurança.
Por que a mente procura por segurança? Porque você percebe que o pensamento se modifica subitamente, a qualquer instante; não há realidade no pensamento; por isso, o pensamento cria o pensante, como entidade permanente que subsistirá indefinidamente; tem, pois, no pensante interesses adquiridos. A mente, assim, encontra a sua segurança no pensante, a certeza, que é o velho hábito.
Temos, pois, de verificar se a mente pode em algum tempo ter segurança, ou se está apegada à mera ilusão de segurança. A mente tem o poder de criar a ilusão de segurança, e, de a ela se apegar; consequentemente, enquanto estiver em busca de segurança, não será capaz de compreender o outro estado. Enquanto a mente não estiver interessada em descobrir o que acontecerá se se ajuntarem o pensante e o pensamento, continuará apegada àquilo a respeito de que está bem segura.
Nosso problema, por conseguinte, consiste em saber se há segurança, certeza. Existe tal coisa? Evidentemente não existe. Você não achará segurança, nem em Deus, nem em sua esposa, nem nos bens materiais que deseja. Não existe segurança. Disso você não está convencido; disso você ainda não teve experiência alguma. Sem segurança, sem coisa alguma em que a mente possa apoiar-se, a que possa segurar-se, apegar-se, reina uma solidão absoluta. Porque a mente teme estar só, a mente inventa o pensante, como entidade permanente, de existência contínua. Ou, se não inventa o pensante, inventa Deus, a propriedade, a esposa... qualquer coisa serve: uma árvore, uma pedra, uma imagem esculpida.
A mente, em seu desejo de segurança, criou o pensante como entidade separada do pensamento e se acostumou a esta divisão pelo hábito; onde existe hábito, existe permanência, e a mente se torna mecânica. Ao perceber realmente — não apenas verbalmente, mas como uma experiência real — que o pensante é o resultado do pensamento, que ele busca permanência na continuidade, você verá então que não há esforço por parte da mente para efetuar a união dos dois. Só existe, então, um estado de compreensão, sem palavras, sem o processo de pensamento constituído de pensante e pensamento. Para tal necessita-se uma extraordinária intuição de todo o processo da consciência, que estivemos considerando nesta tarde, sendo essa intuição o processo da meditação. Essa meditação só é possível quando a mente compreende todo o conteúdo da consciência, isto é, você mesmo.